Em 58 d.C., Popeia Sabina (Poppaea Sabina, em latim) apareceu pela primeira vez na frente do imperador Lúcio Domício Enobarbo, mais conhecido como Nero, que tinha 21 anos e já governava Roma há 4.
Popeia nasceu entre 30 e 32 d.C.: sua mãe, esposa de Tito Ólio, era conhecida por ser a mulher mais bonita do império romano.
O nome do pai foi excluído a Popeia: Tito Ólio, envolvido na conjura de Lúcio Élio Sejano, foi vítima da vingança do imperador Tibério.
Além da beleza, Popeia herdou da mãe o mesmo nome – a mãe é designada como a Velha – um nome que remontava ao avô Caio Popeu Sabino, Legado do Oriente Balcânico. Era uma família de nobreza ilustre, mas não menos comprometida com as tramas de palácio.
Segundo Tácito, Popeia Sabina, a Velha, foi a mais fascinante de todas as mulheres de seu tempo.
Bem cedo, Popeia Sabina perdeu também a mãe, envolvida no processo contra Valério Asiático e induzida ao suicídio por Messalina. Popeia não esquecerá nunca esse acontecimento triste.
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👸 O fascínio irresistível de Popeia Sabina, segunda esposa do imperador Nero
Rúfrio Crispino, primeiro marido de Popeia
Orfã aos 16 anos, ela se casou com Rúfrio Crispino, um cavaleiro que havia exercido o encargo de Prefeito do Pretório, e com ele teve um filho, o qual herdou o mesmo nome paterno.
Parece ser o início de uma pacata vida doméstica. Aristocrática, com conspícuos bens da fortuna familiar – à sua família pertence a esplêndida Vila de Oplontis, em meio aos louros e oleandros do território napolitano, perto de Torre Anunciata – finalmente se casou com um homem que poderíamos definir um bom partido.
Mas a vida de palácio exerce sobre Popeia uma forte e obscura atração: abandona Crispino e começa uma relação com Otão, amigo íntimo do imperador Nero.
Otão, segundo marido de Popeia
O segundo marido, mais novo um ano do que ela, tem fama de imprudente e de libertino: à noite, com outros de seu grupo, dentre eles, como se vocifera, o próprio imperador, vagueia por Roma aprontando com os transeuntes pacíficos.
Otão ocupa o primeiro lugar dentre os amigos do imperador e com este compartilha jogos, prazeres e aventuras, além de participar de todos os segredos e decisões. É orgulhoso de sua belíssima esposa: a beleza de Popeia torna-se um mito em seus discursos.
Chega até mesmo a se afastar dos banquetes do imperador com a desculpa de que sua esplêndida esposa o espera em casa.
É um jogo perigoso: os elogios à mulher, unidos a uma sutil rivalidade, normal entre homens ligados pela cumplicidade e experiências comuns, excitam o jovem imperador Nero.
A indiscutível beleza e o fascínio de Popeia, então com 26 anos, completam a obra.
Nero não resiste ao fascínio de Popeia
Uma vez dentro da corte, a mulher, em pouco tempo, não terá rivais: Nero, mais novo do que ela alguns anos, e ainda ligado à liberta Cláudia Acte, é completamente subjugado, graças também a uma hábil batalha amorosa que alterna luz e sombra, recusas e cedimentos.
Cláudia Acte permaneceu fiel a Nero até a morte do imperador. Foi ela, juntamente com as nutridoras Egloge e Alexandra, que pagaram os duzentos mil sestércios necessários para as exéquias do imperador morto e danado
A personalidade de Popeia aparece intensamente feminina e aparentemente incoerente, caprichosa e volúvel, mas também muito cuidadosa para tirara vantagem própria.
Inescrupulosa e licenciosa na vida privada, porém atenta às aparências e reservada nos comportamentos públicos, era sensível ao fascínio da riqueza e ao esplendor da vida de corte. Acabou sendo realmente conquistada pelo caráter complexo do imperador Nero.
O caráter forte de Nero
Lúcio Domício não podia, por outro lado, contar com seu aspecto físico: suas pernas são sutis, a altura é inferior à média, os cabelos ruivos e os traços dos rosto, agradáveis na sua juventude, ficaram mais pesados precocemente.
Todavia, ele tem uma personalidade poliédrica e um temperamento fora do comum, os quais tornam seus comportamentos e atitudes imprevisíveis.
Nero conquista o que ele tanto deseja: Popeia passa a ser sua enquanto o rival Otão é enviado para governar a Lusitânia, atual Portugal.
Conforme cresce o afeto, consolida-se o poder de Popeia sobre a alma do imperador e ela estende a sua influência até a corte, mesmo se nunca tenha conseguido elaborar linhas políticas autônomas.
Popeia pode contar com poucas armas, mas eficazes e complementares entre si: a beleza de um lado, a agudez do engenho e a habilidade dialética do outro.
A sua atratividade é indiscutível, distingue-a das outras mulheres e fará com que fique também famosa nos períodos sucessivos.
Influenciadora de moda na corte imperial
Na corte imperial, Popeia dita a moda: as atitudes, as roupas, os cosméticos e os tratamentos estéticos são imitados por todas as damas da aristocracia romana.
Uma tintura pros cabelos era muito procurada naqueles tempos: à base de âmbar, dava aos fios um reflexo dourado, intenso, que contrastavam com a cabeleira cor de mel de Popeia, que usava sempre um rabo de cavalo.
Também era muito em voga o uso de leite de jumenta, considerado capaz de retardar o envelhecimento e amaciar a pele, acabando com as rugas.
Eram aconselhadas sete compressas por dia para se obter o efeito desejado. Popeia chegava a mergulhar todo o corpo no leite de jumenta e, para esse fim, aonde quer que fosse, era acompanhada por um rebanho de 500 jumentas.
Seu nome também é ligado à invenção de uma máscara de beleza à base de farinha de centeio, mel, leite de jumenta e aromas. O creme era espalmado no rosto à noite e removido na manhã seguinte com fricções e uma esponja embebida com leite e água.
Depois de o creme ser removido, era aplicada uma máscara nutritiva à base de óleos gordurosos ou um creme emoliente à base de lírios.
A obsessão pela cura do corpo
A cura meticulosa do corpo e a excessiva praticidade com produtos cosméticos eram considerados negativos do ponto de vista dos moralistas mais rígidos, segundo os quais a mulher romana deveria buscar a “verdadeira e pura beleza”, fruto da elegância e da dignidade do comportamento unidas a uma sã e casta vida doméstica.
A cosmética, na verdade, mesmo sendo praticada na Grécia e em Roma, para a moral tradicional era considerada a arte da contrafação e do engano, digna unicamente das cortesãs que de suas belezas tiravam seu ganha pão.
Assim, a excessiva atenção ao corpo, sob um ótica conservadora, andava lado a lado com a corrupção e à licenciosidade que se propagavam em meio ao luxo. Por outro lado, era completamente permitida a cosmética para curar a saúde e limpar o corpo.
Apesar dessas opiniões, Popeia, como grande parte das matronas contemporâneas, tinha um cotidiano personalizado com todos os instrumentos e produtos cosméticos: pentes, pinças depilatórias, maquiagem, cremes, os pequenos e coloridos balsamários em vidro para perfumes, íris de Corinto, açafrão da Cilícia, óleo de rosas de Cirene, lírio de Cízico e de Ilíria.
Mas são, sobretudo, a inteligência e a palavra já na ponta da língua a fazer com que o fascínio de Popeia exerça uma grande influência em quem a encontre.
Ademais, a jovem aristocrática, como muitas mulheres de sua classe, recebeu um boa instrução e possuía uma tal cultura que a permitia participar da vida intelectual dos homens.
Popeia foi muito bem educada
Desde adolescente, como era comum, provavelmente estudou em casa com precetores selecionados que a ensinaram literatura grega e latina, filosofia, música com a prática da lira, canto e, talvez, alguns elementos de geometria.
Devido a isso, ela era também capaz de apreciar, junto com Nero, na arte e no costume, os modelos helênicos e orientais e de aderir conscientemente à convicção, já muito difundida em Roma, de que a civilização helenística representasse um valor superior àquela romana.
O seu interesse pelo hebraísmo é bem noto, tanto é que intercedeu junto ao imperador em favor de alguns sacerdotes hebreus injustamente acusados, assim como não dúvidas de que tivesse uma atração pelos cultos misteriosos e a curiosidade por tudo que fosse ligado à magia e à astrologia.
Em 59 d.C., portanto, somente após um ano de uma breve e intensa relação com o imperador Nero, Popeia é bem decidida a exigir o lugar que é seu de direito na corte imperial como esposa do soberano.
Porém, dois grandes obstáculos se opõem ao seu projeto:
De um lado, está Otávia, filha do imperador precedente, Cláudio, esposa mais de nome do que de fato, mas sempre legítima, de Nero.
Do outro, a mãe do imperador, Agripina, rival aberta da favorita do filho e que sustém arduamente a necessidade de preservar o matrimônio com Otávia, autêntico símbolo da relação com o poder imperial, enquanto esta última é descendente direta da família júlio-claudiana, da qual Nero é membro por adoção.
Todavia, a jovem Popeia não dá pra trás diante dessas dificuldades e usa toda a sua perspicácia para convencer Nero a se desfazer do domínio sufocante que Agripina exerce sobre o filho.
Os assassinatos de Agripina e de Otávia
Em 59 d.C., Agripina é assassinada, mas não podemos saber ao certo se o seu assassinato foi a mando somente por parte de Nero, cansado da intransigente sede de poder da mãe, ou se o imperador também agiu sob influência de Popeia Sabina.
Após o assassinato de Agripina, a relação política de Popeia com Otávia ainda é necessária, já que esta última é muito amada pelo povo, que ameaça até uma revolta caso Nero se divorcie de Otávia.
Popeia se faz de vítima com Nero, dizendo temer pela própria vida e pelo bebê que está para nascer. Ameaça abandonar o palácio imperial e começar uma relação com outro homem se Otávia retomar o seu papel na corte.
O contraste é enorme entre as duas, já que a jovem Popeia tem um desejo insaciável de ascender ao trono imperial.
O espírito moderno de Popeia em uma corte conservadora
A nova companheira do imperador Nero encarna uma figura feminina mais moderna, livre, independente, cheia de vida, sem escrúpulos nos sentimentos e nas ações.
Otávia é o oposto de Popeia: é uma matrona romana tradicional, cujos traços distintivos são a honestidade, a nobreza, a castidade, a modéstia.
A obediência e a devoção ao pai, que a fez desmanchar um noivado legítimo para casá-la com Nero, contribuíram para que Otávia aceitasse com serenidade e firmeza o difícil papel de mulher ao lado de um homem que a ignorava nitidamente.
Pode ter sido a vontade de vingança a mover as ações de Popeia, já que, quinze anos antes, sua mãe se suicidou por causa de Messalina, mãe de Otávia.
Para piorar a situação, Otávia nunca tinha conseguiu engravidar de Nero para lhe dar um herdeiro legítimo. Em junho de 62 d.C., Otávia é exilada e assassinada na ilha de Pandataria (atual Ventotene) a mando de Nero, com a falsa acusa de adultério.
O casamento de Nero e Popeia
Nero e Popeia se casaram doze dias após o afastamento de Otávia. A rapidez desse casamento pode ter sido pela impaciência de Popeia ou por ela já estar grávida de Nero.
Em 21 de janeiro de 63 d.C., na colônia de Âncio, onde Nero nasceu, Popeia dá à luz a Cláudia Augusta, que sobrevive somente por quatro meses. Nero, que festejou o nascimento da filha, também teve que lidar com a enorme dor pela sua perda e mandou divinizá-la.
Nessa ocasião, Popeia também recebeu o título de Augusta por ter dado a Nero uma descendência e a segurança de poder gerar um herdeiro homem futuramente.
A urgência em dar um herdeiro a Nero se concretizou novamente em 64 d.C., quando Popeia, com pouco mais de trinta anos, ficou grávida.
Porém, ela não é mais a deslumbrante e fascinante Popeia de um tempo: apesar das curas estéticas extenuantes, sua terceira gravidez apresentou-se difícil, fadigosa e não priva de perigo, principalmente numa época em que a mortalidade feminina, mesmo por parto, era muito alta e a média de vida de uma mulher era de cerca de trinta e quatro anos.
Morte de Popeia Sabina
No fim do verão de 65 d.C., segundo o historiador romano Suetônio, Popeia teria sido assassinada pelo próprio Nero, em uma crise de ira, com chutes em seu ventre, ainda gestante, mas essa afirmação é contestada por vários historiadores que acreditam que Popeia tenha morrido por problemas decorridos da gravidez ou por ela estar doente, como mencionou o próprio Suetônio.
Ademais, Nero era perdidamente apaixonado por sua esposa e desejava muitíssimo ter um filho.
Nero ficou muito perturbado com a morte de Popeia e mandou realizar um funeral com toda pompa magna.
Seu corpo não foi queimado, como era o costume romano, mas foi embalsamado, segundo as tradições dos soberanos bárbaros, e colocado no sepulcro da família Júlia.
Em 68 d.C., é erguido um templo em sua honra, com uma inscrição à deusa Sabina Venus. Talvez Nero tivesse se inspirado ao culto da irmã de Calígula, Drusila, esta também divinizada e assimilada a Vênus.
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*Referências bibliográficas:
- Tradução e adaptação minhas do texto em italiano – Poppea Sabina, tra storia e mito – de Maria Luigia Pagliani (1992).
- Vida dos Doze Césares, de Suetônio.