Em 29 de agosto de 2015, visitei, pela primeira vez, o palácio do imperador Nero, mais conhecido como Casa Dourada ou Domus Áurea (Domus Aurea, em latim), no Monte Ópio (Colle Oppio, em italiano), perto do Coliseu.
Já em agosto de 2021, voltei à Casa Dourada para apreciar a mostra Raffaello e la Domus Aurea. L’invenzione delle grottesche.
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Uma curiosidade sobre a Domus Áurea
Antes da construção da Casa Dourada, o palácio imperial de Nero era a Domus Transitória, cujos restos podem ser vistos em uma visita especial pelo Palatino.
Depois de ter assistido, em outubro de 2014, a um documentário no canal Sky Arte sobre esse grande palácio, o qual foi construído por ordem do imperador romano Nero após o incêndio que devastou Roma em 64 d.C., finalmente pude apreciar alguns de seus ambientes que são abertos ao público.
Dicas de Roma: Casa Dourada do imperador Nero
Bem! Finalmente posso começar a viver como um ser humano.
— Nero, quando entrou pela primeira vez na Casa Dourada.
Mas para que a visita pela grandiosa Casa Dourada possa ser usufruída em grande estilo, que tal aprender algumas curiosidades e fatos históricos ligados a este sítio arqueológico?
Um palácio digno de imperador romano!
Inicialmente, a Casa Dourada do imperador Nero tinha cerca de 80 hectares e cobria a área que hoje compreende o Monte Palatino, Esquilino, Ópio e parte do Monte Célio.
A casa imperial foi construída em apenas quatro anos, entre 64 e 68 d.C., e utilizada algumas décadas depois por Trajano, imperador que mandou construir as suas termas sobre esse palácio romano, as quais ficaram enterradas por séculos e só foram descobertas em 1480 graças a alguns desabamentos no terreno do Monte Ópio.
Assim, muitos artistas renascentistas desceram pelas fendas abertas nesse monte e descobriram as majestosas salas da antiga Casa Dourada de Nero que tinha sido englobada pelas termas do imperador Trajano.
Fundação de Roma
Roma foi fundada em 753 a.C. e desenvolveu-se sobre sete colinas: Capitólio (Capitolino), Quirinal (Quirinale), Viminal (Viminale), Esquilino, Célio (Celio), Aventino e Palatino.
O palácio contava com 155 cômodos de várias dimensões, com uma extensão total de nada mais nada menos que 16.000 metros quadrados.
Havia jardins e muitos ambientes reservados a festas e a estadias para os hóspedes do imperador romano.
No centro de seus jardins, surgia um lago artifical, sobre o qual, mais tarde, iria ser construído o famoso Coliseu.
O palácio também tinha áreas com vários animais domésticos e exóticos, muitos vindos da África, além de estátuas, escadas, bosques, piscinas, etc.
Por que o nome Domus Áurea (Casa Dourada)?
Este palácio era dedicado ao Deus Sol, provavelmente porque Nero, depois do incêndio de 64 d.C., decidiu ser representado em uma enorme estátua que homenageasse essa divindade.
O Colossus Neronis (Colosso de Nero) representava, assim, o Deus Sol, com raios solares esculpidos sobre a sua cabeça que chegavam a ter até 6 metros de comprimento.
Colocada na entrada principal do palácio sobre o Palatino, o Colossus foi readaptado nos anos sucessivos com a representação da cabeça dos outros imperadores romanos até que Adriano o retirasse dali para dar lugar ao Templo de Vênus e de Roma.
” … a Domus Aurea abraçava toda a Roma … “
(Plínio, História Natural, XXXII, 54)
e em outro trecho conta que o palácio chegava a
“… alargar-se até circundar a cidade …”
(Plínio, História Natural, XXXVI, 111)
Tradução livre
Anfiteatro Flávio
O Anfiteatro Flávio passou a ser chamado de Coliseu, na Idade Média, devido à estátua Colosso de Nero, situada nos seus arredores.
Da Casa Dourada, hoje só existem os 155 ambientes construídos no Monte Ópio, os quais estão articulados em função da sala octogonal, o verdadeiro fulcro de todo o complexo arquitetônico.
Essa sala, com oito lados, tem uma cúpula que deixava entrar a luz diurna, construída completamente em cimento.
É circundada por cinco salas e, do ponto de vista arquitetônico e da engenharia, é uma verdadeira obra de arte, pois, diferentemente das cúpulas que vemos nas igrejas, não precisa de muros e de sustentamentos laterais para mantê-la em pé: apoia-se somente sobre os pilastres que podemos ver na sua estrutura.
Uma verdadeira inovação pra aquela época e que serviu de inspiração para a famosa cúpula do Panteão romano
A veia artística de Nero
Era debaixo dessa cúpula octogonal que Nero se exibia, sob os raios solares, encarnando uma divindade, o próprio Deus Apolo.
O imperador, totalmente obcecado pelo seu status de artista, fazia de suas festas verdadeiras obras de arte, as quais, certamente, foram as mais badaladas já realizadas durante o Império Romano.
Tanto é que, trezentos anos após a sua morte, durante os espetáculos públicos ainda eram distribuídas moedas com a efígie de Nero.
Na Casa Dourada, como dizia Sêneca, tudo resplandecia pelo brilho do ouro.
Os afrescos cobriam cada superfície que ainda não tivesse sido decorada.
A grande fama dos estuques e das pinturas do palácio de Nero está ligada ao artista Fabullo (citado nos textos de Plínio, o Velho) pelo seu estilo rígido e sua mania de pintar vestido com uma toga, mesmo se em cima de um andaime no canteiro de obras.
Mas foi mesmo Nero quem mandou incendiar Roma?
Depois da morte de Nero, o terreno da Casa Dourada foi restituído ao povo romano pelos imperadores sucessivos.
Em somente cerca de 10 anos, esse palácio foi completamente destituído de suas decorações preciosas.
As fontes históricas antigas, que citam o imperador Nero como o causador do incêndio de 64 d.C. que atingiu o Circo Máximo e seus arredores, são, como explicadas por muitos estudiosos contemporâneos, intrigas da oposição daquela época.
Assim, tudo aquilo que lembrasse a dinastia de Nero, deveria ser completamente esquecido. E assim foi.
A Casa Dourada ficou escondida por muito tempo
Durante os séculos, a Casa Dourada foi sepultada por novas construções, porém, por sorte, as pinturas nas suas paredes sobreviveram graças à areia que as protegia da forte umidade.
Até quando, em 1480, um jovem romano caiu por acaso em um buraco no Monte Ópio e encontrou uma estranha gruta, repleta de figuras desenhadas.
Assim, vários artistas daquela época começaram a descer com uma corda até essa gruta para poder ver as pinturas nas suas paredes.
O estilo grotesco
Pinturicchio, Ghirlandaio, Rafael Sanzio, Michelangelo (alguns estudiosos não afirmam com certeza se realmente Michelangelo tenha visto as pinturas da Casa Dourada) e outros desciam até a gruta com velas para poder iluminar suas obras-primas, ficando extasiados com o estilo da arte como era representada na Antiguidade.
Assinatura de Pinturicchio na parede
Existe a assinatura de Pinturicchio em uma parede na Casa Dourada. A guia nos mostrou a parede, porém, por estar no alto e ter letras pequenas, não dá para vê-la nitidamente.
Esses artistas e outros que trabalhavam em Roma naqueles anos passaram a difundir as grotescas: decorações que entraram em voga no Renascimento e que devem seu nome a essa descoberta casual das grutas da Casa Dourada do imperador Nero.
Até Leonardo da Vinci ficou extasiado pela pintura grotesca
Tal estilo refinado, com arquitetura elegante e cenas mitológicas de animais fantásticos, inspirou as decorações renascentistas nos Museus Vaticanos, Castelo Sant’Angelo e Palácio Madama.
Às vezes, essas decorações eram verdadeiras imitações do que os artistas encontraram nas grutas da Casa Dourada, mas, às vezes, também eram criações próprias. Leonardo da Vinci foi inspirado pelas pinturas grotescas.
Influência na arte flamenga
Mas nem todos os artistas apreciavam esse estilo artístico, pois o consideravam muito extravagante e fantástico, como Giorgio Vasari e Vitrúvio.
Mas as grotescas se espalharam por toda a Itália, sob solicitação de príncipes, nobres e papas, além de terem sido exportadas para outros países, como França e Bruxelas, influenciando também a arte flamenga.
Quando as pinturas foram descobertas, elas ainda eram vivas e brilhantes, mas, infelizmente, logo começaram os problemas de conservação pela forte umidade que acabou por destruir afrescos e estuques.
Somente após a descoberta das obras de Pompeia é que os estudiosos se interessaram novamente pelas grotescas e, em 1772, foram retomadas as escavações da Casa Dourada.
Como visitar a Casa Dourada do imperador Nero
A Casa Dourada é acessível exclusivamente com reserva on-line obrigatória.
Atenção: Use sapatos cômodos para a caminhada e leve uma roupa de manga comprida para a temperatura de cerca de 18º no interior do sítio arqueológico.
Para todas as informações atualizadas, consulte diretamente o site da cooperativa responsável.
*Texto livre meu baseado no documentário de Sky Arte.
4 comments
Excelente texto!
Obrigada, Gislayne!
Tenha um ótimo fim de semana.
Maria